Descubra os sabores do Alentejo nos melhores restaurantes Alentejanos em Lisboa
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Situado entre as populares regiões de Lisboa e do Algarve, o Alentejo pode passar despercebido por muitos visitantes estrangeiros. No entanto, esta região do sul tem um grande charme. A sua geografia diversa varia de extensos campos abertos a montanhas escarpadas e vistas deslumbrantes do oceano. A região do Baixo Alentejo é conhecida pelas suas amplas planícies e uma paisagem rural caracterizada por cores terrosas e céus abertos. No norte, o Alto Alentejo é marcado por colinas ondulantes e terreno montanhoso, oferecendo vistas panorâmicas e uma atmosfera mais robusta. Finalmente, a zona costeira, estendendo-se ao longo do Oceano Atlântico, contrasta com a paisagem interior, com praias lindas e bem preservadas, falésias dramáticas e enseadas serenas, onde assistir ao pôr do sol sobre o oceano Atlântico é uma experiência inesquecível.
Historicamente uma região mais pobre e menos populosa que as zonas suas vizinhas, com a agricultura e a criação de gado como suas principais atividades económicas, o Alentejo é conhecido até hoje por seu ritmo de vida calmo e lento, onde as pessoas levam o seu tempo e geralmente têm um estilo de vida mais descontraído. De facto, muitos lisboetas escolhem o Alentejo como um lugar para relaxar e fugir da correria da vida urbana, aproveitando as belas paisagens, as praias deslumbrantes e a gastronomia deliciosa desta região.
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Há certamente muitas razões para visitar esta parte do país, e embora nem todos que visitam a capital portuguesa possam desfrutar de tudo o que o Alentejo tem a oferecer, há lugares que são perfeitos para visitar numa escapadinha de um dia a partir de Lisboa, tais como Évora, por exemplo. E se estiver interessado em explorar o panorama de restaurantes da região, descobrirá que há restaurantes fora de Lisboa que valem mesmo a pena a viagem.
No entanto, mesmo que não possa viajar para o Alentejo, o Alentejo pode viajar até si. Ao longo do tempo, muitos alentejanos migraram para a mais movimentada capital, em busca de emprego e uma vida melhor, e com eles trouxeram o seu amor pela sua culinária, que agora é considerada por muitos como uma das gastronomias regionais mais representativas de Portugal. Vamos descobrir um pouco mais sobre o que caracteriza a comida do Alentejo, os seus pratos mais representativos e imperdíveis e, o mais importante, onde pode desfrutá-los sem sair de Lisboa.
Os sabores típicos do Alentejo
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A cozinha alentejana reflete a sua história e as dificuldades da região, bem como o engenho e a resiliência do seu povo. Tal como a cucina povera de Itália, a culinária alentejana baseia-se em ingredientes humildes e locais: alho aromático, pão delicioso e robusto, azeite e uma variedade de ervas frescas como coentros, hortelã, orégãos e poejo, uma planta selvagem semelhante à hortelã. Estes ingredientes, embora simples, formam a espinha dorsal dos saborosos pratos desta região.
A coleta selvagem também desempenha um papel significativo na culinária alentejana, com verdes e ervas selvagens adicionando riqueza e fragrância ao que pode parecer à primeira vista confecções tradicionais bem simples. Pratos como sopa de beldroegas e ovos com espargos são tradicionalmente feitos com ingredientes apanhados diretamente da natureza (neste caso, a beldroega e os espargos selvagens) e exigem não só uma certa conexão com a terra, mas também o respeito pelo conceito de sazonalidade.
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No entanto, no Alentejo, a simplicidade dos ingredientes não reflete apenas escassez; os próprios ingredientes são celebrados e reverenciados. Famoso em todo Portugal, o pão regional, comumente conhecido como pão alentejano, é caracterizado por sua crosta grossa e crocante, bem como um interior denso, porém húmido, marcado por bolsas de ar, e como uma aparência rústica. Com ingredientes mínimos – sal, água e farinha de trigo – extrai o seu sabor pleno e ligeiramente ácido do processo de fermentação mais lento pelo qual passa. Todas essas características fazem do pão alentejano o ingrediente perfeito para as receitas do Alentejo, onde pode ser frito ou usado em caldos e sopas, conferindo-lhes uma deliciosa robustez.
Os portugueses levam muito a sério os seus queijos, e nesta matéria, esta região não é exceção. Famosos em todo o país, os queijos do Alentejo são conhecidos pela sua robustez, bem como pelos seus sabores ousados. Feitos de leite de ovelha, vaca ou até de cabra, são geralmente semi-moles ou duros (dependendo do tipo de queijo) e muitas vezes têm um longo processo de maturação. Entre os mais famosos estão o queijo de Serpa, um queijo de leite de ovelha semi-mole conhecido pela sua textura suave e cremosa e sabor ligeiramente ácido e salgado; o queijo de Nisa, um queijo de leite de ovelha duro, da região de Nisa, com uma textura firme e um sabor mais pronunciado e aveludado quando envelhecido, tipicamente seco e esfarelado com um sabor acentuado e saboroso; e o queijo de Évora, um queijo semi-mole, feito de leite de ovelha, caracterizado por uma textura suave, ligeiramente granulosa, bem como um sabor suave e cremoso com um ligeiro toque ácido.
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Embora muitos possam considerar a culinária alentejana como a mais amigável para vegetarianos de entre todas as cozinhas regionais portuguesas, ela também faz uso de produtos de origem animal, sendo a carne de porco, de longe, a proteína animal mais consumida. A carne de porco é central na culinária alentejana devido à longa história de criação de porcos na região, que remonta aos tempos romanos. Tradicionalmente, os animais criados nesta região são os porcos pretos ibéricos alimentados com bolota e que pastam no montado, um sistema agroflorestal tradicional de florestas de sobreiros. No montado, os porcos deambulam livremente, comendo bolotas e ervas selvagens, o que confere à carne um sabor mais rico, bem como uma melhor distribuição de gordura e carne magra. O sistema do montado também está ligado a uma forma mais sustentável de criar animais porque promove a biodiversidade, previne o sobrepastoreio e permite a regeneração natural da terra. A popularidade da carne de porco no Alentejo também está ligada à sua versatilidade (não só os alentejanos mas todos os portugueses tradicionalmente a utilizam, do focinho até a cauda) bem como à sua capacidade de ser preservada através da cura, tornando-a uma fonte de proteína fiável durante todo o ano.
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Tal como acontece com os queijos, os enchidos são um elemento chave em Portugal. No caso do Alentejo, o porco preto ibérico é novamente o destaque. O presunto de porco preto, tal como o seu primo, o presunto Ibérico espanhol, é um presunto curado a seco feito a partir dos preciosos porcos pretos ibéricos. Curado durante vários meses, desenvolve um sabor rico e aveludado e uma textura delicada, tornando-o uma iguaria regional e provavelmente uma das carnes curadas mais celebradas de todo o Portugal. No entanto, há mais enchidos de qualidade a celebrar na região, como o delicioso paio. Este enchido é feito de lombo de porco magro, temperado com alho, sal e envolto no estômago de um porco, para ser primeiro cozido e depois secado ao ar. É frequentemente apreciado fatiado como um snack ou aperitivo, uma vez que é feito de pedaços de carne mais delicados (e caros). Finalmente, a cacholeira, um enchido de Montalegre, é um produto mais rústico em comparação com o paio, uma vez que é um enchido mais mole feito de fígado de porco e gordura, temperado com especiarias como alho e cominho. O seu sabor forte e terroso provém tanto dos seus temperos como da carne do porco preto.
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Finalmente, não se poderia escrever sobre a comida do Alentejo sem mencionar o seu vinho. O Alentejo é uma das regiões vinícolas mais populares de Portugal, e uma das mais variadas, dada as suas características geográficas e meteorológicas diversas. Tal como noutras regiões portuguesas, o vinho no Alentejo é marcado pela presença de castas locais. As castas tintas mais populares incluem Alicante Bouschet, Aragonês (conhecido como Tempranillo em Espanha) e Trincadeira. Para os brancos, Antão Vaz destaca-se, juntamente com Arinto e Roupeiro. Toda esta variedade de uvas e perfis de vinho garante que, com qualquer bom prato do Alentejo, se encontra sempre um vinho alentejano perfeito para harmonizar!
Pratos alentejanos imperdíveis
É difícil selecionar o que destacar como pratos que não deve perder, e há sempre alguns que não vão aqui ser mencionados, embora isso não signifique que não o mereçam. Além disso, uma vez que a sazonalidade é tão importante nesta gastronomia regional, pode ser difícil encontrar alguns pratos durante todo o ano. No Alentejo, geralmente não se come gaspacho durante os meses frios, e ingredientes como espargos selvagens e beldroegas só podem ser colhidos durante os meses da primavera ou mesmo no início do outono. Alguns pratos também podem ser mais difíceis de encontrar em Lisboa devido ao seu caráter ultra regional ou ao uso de ingredientes mais incomuns, que nem sempre são apreciados por muitas pessoas hoje em dia. Independentemente das limitações que se possa ter ao procurar comida alentejana em Lisboa, vale a pena manter uma mente aberta, ser flexível e desfrutar da oferta gastronómica que sem dúvida é ainda muito variada. E se num restaurante lhe recomendarem um prato que não está nesta lista, não deixe de o provar. No que diz respeito a receitas tradicionais do Alentejo, o que não falta são boas opções!
Petiscos
Se há uma região que parece levar a arte dos petiscos a sério, é o Alentejo. Os petiscos não são apenas snacks ou pequenos pratos. São comidas feitas para serem partilhadas e para serem comidas descontraidamente, idealmente com um bom copo de vinho ou mesmo uma cerveja, pelo que se pode logo ver como se encaixam perfeitamente com a cultura relaxada do Alentejo.
Os petiscos alentejanos variam imensamente. Desde os simples aos mais elaborados, incluindo pratos sem carne a pratos extremamente ricos em carne, há sempre algo para todos. Obviamente, as carnes curadas e os queijos mencionados acima, bem como o delicioso pão alentejano são incontornáveis quando falamos das delícias do Alentejo na hora de petiscar, bem como as saborosas azeitonas locais, muitas vezes temperadas com alho e orégãos, para um sabor português marcadamente sulista.
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Um dos petiscos mais emblemáticos são os enganosamente simples ovos mexidos com espargos, que tradicionalmente são feitos com espargos selvagens, colhidos na primavera. A sua simplicidade e dependência de ingredientes locais, sazonais e apanhados de forma selvagem encapsulam perfeitamente o espírito da culinária alentejana.
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Embora alguns destes petiscos possam ser mais difíceis de encontrar em Lisboa, a pequena mas representativa empada de galinha ganhou tanta popularidade que poderá encontrá-la na maioria das pastelarias da capital. Muitas vezes desfrutadas como um snack rápido, poder-se-ia perdoar esquecer o quanto são demoradas e trabalhosas de preparar, envolvendo cozer um frango inteiro temperado com cebola, bacon, cravinho, pimenta preta, sal e vinagre, depois desfiá-lo e fritá-lo em cubos com o bacon, e depois encher as forminhas de massa folhada com a mistura para obter uma deliciosa empada que é perfeita para quando se deseja um pequeno lanchinho entre as refeições principais do dia.
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Embora haja muitos petiscos acessíveis a iniciantes, algumas das iguarias mais especiais podem requerer uma mente aberta e uma certa vontade de provar algo um pouco diferente. A história humilde desta região ensinou o seu povo a ser engenhoso e, portanto, a usar todas as partes dos animais que abatiam. Com o tempo, o que nasceu da necessidade tornou-se um tesouro muito apreciado. Entre algumas destas comidas bizarras portuguesas estão os pézinhos de coentrada, que consistem em pés de porco cortados em pequenos pedaços, cozidos e fritos em azeite, alho, cebola, coentros, cravinho e algumas malaguetas; a salada de orelha, uma salada fria de orelha de porco cozida e picada, temperada com cebola crua cortada aos cubos, alho, azeite, vinagre e coentros; ou a cabeça de xara, também conhecida como queijo de cabeça de porco. Este último prato é particularmente interessante, não só pelas suas características, mas também pela sua origem, que alguns pensam ser francesa (do prato tête d’achard), e outros acreditam poder ser árabe. É feito cozendo a cabeça inteira de um porco com vinho, água, vinagre e muitas ervas, até que a carne se solte dos ossos, e depois removendo todos os ossos, deixando a carne, pele, gordura e cartilagem, que é picada e prensada na forma de um queijo, com a ajuda de um pano, corda e um peso, durante pelo menos 24h. O resultado é um petisco intenso e rico que implora por algum pão e vinho para acompanhar.
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Finalmente, talvez um dos pratos mais desafiantes, e talvez o mais difícil de encontrar, são os túbaros, ou testículos. De facto, essa parte da anatomia animal também é consumida, porque no Alentejo, comer do focinho ao rabo significa literalmente todas as partes do animal. Embora se possam usar testículos de touro ou até de cordeiro, os mais comuns na região são os testículos de porco. Apesar das ideias preconcebidas sobre a textura deste prato, o método de confecção – cozendo, retirando a pele, cortando em pedaços e depois fritando em azeite, ou mais tradicionalmente, em banha – garante uma textura firme e ligeiramente mastigável, com o sabor intenso atenuado pela marinada usada. Se conseguir encontrar esta elusiva iguaria, que hoje em dia muitas vezes só pode ser encontrada mesmo no Alentejo, e por encomenda, não deixe de a experimentar.
Gaspacho Alentejano
Imagem cortesia de Ruralea
Ao contrário do seu homólogo andaluz mais famoso, que se baseia numa base misturada de tomates maduros, pepinos, pimentos verdes, alho, azeite, vinagre e pão, resultando numa sopa sedosa e bebível, o gaspacho alentejano é um prato mais rústico e centrado no pão. Tomates cortados aos cubos, pepinos, pimentos verdes, alho esmagado e ervas como orégãos são misturados com água (com cubos de gelo adicionados frequentemente para um frescor extra), azeite, vinagre e sal. O pão alentejano crocante, muitas vezes um pouco duro, é adicionado diretamente à sopa, absorvendo o líquido. Com o seu caldo de alho gelado e sabor a vinagre pronunciado, é especialmente delicioso nos dias de verão escaldantes do Alentejo, ao mesmo tempo que prova mais uma vez como esta cozinha regional faz uso habilidoso de ingredientes simples e de boa qualidade para fazer comida deliciosa.
Tomatada
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Outra receita humilde, simples de preparar e sem carne que ainda consegue oferecer uma enorme quantidade de sabor e umami é a deliciosa tomatada. Na sua essência, a tomatada é um estufado rico de tomate, preparado com tomates sazonais muito maduros, alho, cebolas e azeite, todos lentamente cozinhados para criar um molho reconfortante. Os ovos são frequentemente escalfados diretamente na mistura de tomate, adicionando uma riqueza cremosa que combina maravilhosamente com os tomates ácidos e ligeiramente doces. Algumas variações incluem a adição de chouriço ou bacon para uma maior profundidade de sabor e um toque salgado, mas o prato continua a ser delicioso mesmo na sua forma mais simples. A tomatada, que poderíamos dizer ser a versão de Portugal de shakshouka, é tipicamente servida com grossas fatias de pão alentejano, que são perfeitas para absorver o molho, embora nos últimos anos também se tenha começado a servir com batatas fritas, tornando o prato mais substancial e transformando-o numa refeição principal mais completa. No entanto, quer esteja a mergulhar pão ou batatas fritas nesta maravilha de tomate, a experiência será sempre boa.
Sopa de beldroegas
Imagem cortesia de Ruralea
A beldroega é outro verde que é obtido através da colheita selvagem, o que torna este prato outra iguaria sazonal, e a primeira de algumas sopas aromáticas na nossa lista. Embora seja nomeada com base nesta erva, esta sopa é também geralmente feita com queijo (que pode ser queijo fresco mole, queijo de ovelha mole ou mesmo queijo duro) e batata fatiada, e a beldroega (que é um ingrediente sazonal, que cresce espontaneamente, muitas vezes em volta de hortas) pode ser substituída por espinafres, ou até alface. Mais uma vez somos apresentados a um prato que demonstra a adaptabilidade dos alentejanos, que popularmente afirmam que “no Alentejo, com qualquer erva se faz uma sopa”. Não restam dúvidas disso!
Sopa de cação
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Talvez o prato de peixe mais famoso de todo o Alentejo, esta sopa aromática é feita com cação, um tipo de tubarão de carne branca e firme, que é primeiro marinado em água, vinagre, sal e folha de louro durante algumas horas para suavizar a estrutura peixe e preservar as qualidades da sua carne. O peixe é gentilmente cozinhado num caldo saboroso temperado com alho, coentros, folhas de louro, azeite e, por vezes, colorau. A sopa é então espessada com um pouco de farinha dissolvida em vinagre, que também confere um toque característico alentejano. Como muitas sopas desta região, é servida numa cama de pão alentejano, cuja presença confere a esta sopa uma robustez que certamente a transforma num prato principal substancial.
Açorda à Alentejana
Imagem cortesia de Visit Portugal
Se tivéssemos de nomear um prato essencial desta região, seria a açorda à Alentejana. Humilde, algo personalizável mesmo dentro dos seus moldes caracteristicamente simples, e focada nos principais ingredientes desta cozinha regional (pão, alho, azeite e ervas), a açorda Alentejana é, basicamente, o Alentejo num prato.
No entanto, para entender este prato é preciso primeiro perceber o que é uma açorda. Este método de cozinhar (e de usar pão velho, no processo) foi trazido para a Península Ibérica pelos árabes, que a chamavam “ath thurda” ou “ath thorda” no dialecto árabe andaluz local, e que significa “pão desfiado e embebido”. Esta definição muito geral de açorda ganhou no Alentejo uma definição muito mais restrita, uma vez que na região é caracterizada como um caldo quente e claro com uma base de alho esmagado com sal e azeite, e aromatizado com ervas, que é derramado sobre o pão. As ervas utilizadas podem mudar, sendo os coentros e o poejo os mais populares, e o caldo pode ser enriquecido usando ovos escalfados, peixe cozido ou frito, ou mesmo bacalhau salgado.
Podemos agora ver como algumas das sopas anteriormente mencionadas, como a sopa de cação, ou a sopa de beldroegas também poderiam ser consideradas uma açorda. Por outro lado, o que para muitas pessoas no Alentejo não seria considerado como tal é a açorda de marisco ou a açorda de camarão que podem ser comumente encontradas em muitos restaurantes em Lisboa, e que têm muito pouco caldo e muito mais pão, e são engrossadas com gema de ovo, dando-lhes a textura não tanto de uma sopa, mas mais de uma papa espessa e deliciosa. De facto, muitas pessoas no Alentejo chamariam a este prato migas de camarão, pela sua consistência e potente sabor. Por isso, se encontrar um prato de açorda enquanto estiver na capital, tenha em conta estas diferenças, porque pode estar à procura de um bom prato e encontrar outro diferente, embora também delicioso.
Migas
Imagem cortesia de Michelin Guide
Mais do que uma receita, as migas são mais um tipo de prato, um primo da açorda, que partilha a sua origem árabe. Ambos envolvem o uso de pão velho, numa demonstração de frugalidade e engenho, mas enquanto a açorda é uma preparação caldosa, nas migas o pão é embebido em água, mas tem uma consistência muito mais espessa, transformando-se mais numa pasta, muitas vezes frita em azeite ou gordura de porco. Pode então ver-se por que motivo os alentejanos olharão para a nomeação da açorda de marisco de Lisboa com confusão e, por vezes, até com irritação.
Uma das receitas de migas mais famosas traz de volta um velho amigo selvagem, o espargo: migas com espargos. Os espargos verdes selvagens são cozidos e adicionados às migas que são geralmente feitas usando a gordura e os temperos da carne de porco que foi previamente frita. As migas devem ser cozinhadas até se formar uma crosta deliciosa à sua volta, e são servidas com a carne frita. Existem, claro, diferentes variações deste prato, algumas envolvendo ovos ou até miolos de porco, e podem ser feitas ainda mais simplesmente com azeite em vez de gordura de porco.
Outra versão talvez mais pesada mas provavelmente mais comum deste prato são as migas com entrecosto, semelhantes na preparação à versão anterior, mas mais centradas na carne. Aqui, as costelas marinadas durante a noite em pasta de pimento vermelho e alho, são fritas, com a gordura subsequente (chamada pingo) usada para fazer as próprias migas. Enquanto se cozinham, à medida que desenvolvem uma crosta, podem ser enroladas sobre si mesmas numa forma semelhante a uma omelete, crocante por fora e untuosa por dentro. O risco de fazer migas gordurosas é alto, pelo que é necessária uma mão experiente para garantir que saem bem. Nos restaurantes, são por vezes servidas com fatias de laranja, que trazem um frescor adicional a este prato, combinando na perfeição com o entrecosto.
Um prato de migas que nunca falha em invocar nostalgia nos corações dos nascidos e criados do Alentejo são as migas de batata. Neste prato, o pão é substituído por batatas cozidas (que muitas vezes eram sobras de outras refeições) esmagadas ou em puré, e misturadas com o pingo, da mesma forma que outras versões de migas. As migas de batata não são tão fáceis de encontrar fora do Alentejo como outros pratos, por isso, se as vir num menu, não deixe de as provar.
Finalmente, embora as migas possam ser feitas com ingredientes variados, diferentes cortes de carne ou até peixe e ovo, podem ser tão básicas, e ainda assim saborosas, como as naturalmente vegan migas gatas. Pão, água, alho e azeite é tudo o que precisa para fazer esta versão, e se adicionar aromáticas como coentros ou poejo, pode criar uma delícia ainda mais saborosa. Quer experimente uma receita mais complexa e rica em carne, ou uma versão mais leve e simples, não deixe de saborear este ícone imperdível da culinária alentejana.
Carne de porco à Alentejana
Imagem cortesia de Cozinha Com Rosto
Este prato regional bem conhecido não é apenas um sucesso local, mas com o tempo tornou-se um dos pratos mais icónicos de Portugal, devido ao seu sabor viciante, onde cubos de porco intensamente aromatizados são marinados numa mistura de alho, colorau, vinho branco, folhas de louro e azeite, que lhe conferem um sabor rico e fumado, e são depois combinados com amêijoas, que são cozinhadas no mesmo tacho, infundindo o prato com uma profundidade de sabor salgado. O toque final é coentro fresco, que contrasta com o seu frescor com os outros sabores ricos. O facto de ser frequentemente servido com batatas fritas douradas aos cubos torna-o numa receita incrivelmente apetitosa, e o prato mar e terra mais conhecido de Portugal.
Ensopado de borrego
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Normalmente comido na Páscoa, em casamentos e outras grandes celebrações, este prato era um que geralmente só se comeria em dias importantes, pois é feito com carne de borrego, marinada durante horas numa mistura de vinho, alho, folha de louro, colorau e pimenta preta, para amaciar a carne e remover parte do seu característico cheiro forte a bedum. A carne é depois dourada em azeite e estufada na própria marinada, com um toque de vinagre adicionado no final, que adiciona um frescor muito alentejano ao prato. Muitas variações deste prato também incluem hortelã no estufado, que também lhe confere um delicioso brilho herbáceo. Finalmente, como estamos a falar de comida do Alentejo, a carne é servida numa cama de pão, e acompanhada de batatas cozidas, cuja cremosidade equilibra perfeitamente os sabores fortes da carne marinada.
Doçaria tradicional do Alentejo
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Tal como no resto do país, as sobremesas e pastelaria no Alentejo tendem a ser ricas em gemas de ovo, uma vez que muitas destas delícias doces têm origem em conventos, onde as freiras tinham muitas gemas de ovo sobrantes, depois de usar as claras para engomar os seus hábitos, o que criou uma oportunidade de negócio que literalmente moldou a pastelaria portuguesa. Um exemplo particularmente interessante desta tradição conventual é o pão de Rala (aqui fotografado), assim chamado porque se assemelha a um pão rústico. A sua casca exterior é uma pasta feita a partir de uma mistura de farinha de amêndoa, açúcar, gemas de ovo e água, que é depois esticada e recheada com fios de ovos (fios doces de gema de ovo que são feitos vertendo delicadamente gema de ovo num xarope de açúcar a ferver) e doce de gila (uma compota muito tradicional alentejana, feita a partir da polpa da gila, ou abóbora-chila, que é cozida com açúcar e aromatizada com canela e limão, resultando numa compota texturizada e aromática). Esta bomba de açúcar, cujas primeiras menções por escrito remontam ao século XVIII, mas que é muito provavelmente mais antiga do que isso, deve de ser comida com moderação, mas certamente satisfará os mais gulosos.
Outra opção doce muito interessante, originária dos conventos da da região, é o toucinho do céu. Embora possa conter banha em vez de manteiga na lista de ingredientes, esta sobremesa pesada e rica em ovo, não leva toucinho propriamente dito. Em vez disso, os seus principais ingredientes são farinha de amêndoa, gemas de ovo e açúcar, e é aromatizada com canela e cravinho. Esta mistura celestial é então cozida no forno e servida coberta de açúcar em pó, pronta a ser apreciada.
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Apesar da popularidade dos doces conventuais, há no Alentejo algumas sobremesas com origens ainda mais interessantes. Diz-se que a sericaia foi trazida do oriente por D. Constantino de Bragança que no século XVI governou os territórios portugueses na Índia, sendo esta a primeira sobremesa em que a maioria das pessoas pensa, quando pensa em doces alentejanos. Indispensável em ocasiões festivas, esta sobremesa é um pouco mais leve do que as anteriores, devido à presença de claras de ovo, que são incorporadas numa mistura de gema de ovo, açúcar, leite e farinha, aromatizada com canela e a muito portuguesa casca de limão, já que os portugueses adoram um toque cítrico nos seus doces. A mistura é então vertida em tachos de barro e cozida num forno super quente, de modo a desenvolver o seu característico aspecto “rachado”. Finalmente, deve ser servida com outra iguaria regional, a ameixa de Elvas, uma ameixa local extremamente doce do tipo Rainha Cláudia, obtida devido às temperaturas muito altas que a região atinge no Verão. Embora possa ser comida fresca, é muitas vezes seca e conservada em calda, e é esta última versão que tradicionalmente acompanhará a sericaia, conferindo-lhe um sabor e textura contrastantes que realmente elevam esta celebradada sobremesa.
A icónica ameixa de Elvas em conversa também acompanha tradicionalmente outra sobremesa do Alentejo, que neste caso tem origem no Convento de Santa Clara, em Portalegre: o manjar branco, ou delícia branca. Esta é uma sobremesa mais delicada, e embora a sua lista de ingredientes seja simples (farinha de arroz, açúcar, leite e açúcar) requer bastante habilidade culinária, de modo a fazer a calda de açúcar com uma consistência muito específica, que será adicionada ao resto dos ingredientes para formar uma massa espessa que é moldada em “pétalas” para dar a esta receita muito visualmente apelativa a sua forma característica de flor. Depois de cozinhada no forno, e de ganhar alguma cor, é consumida ou pegando nas pétalas à mão, ou num prato, com acompanhamento de ameixa de Elvas, juntamente com um pouco da calda das ameixas. Ao saborear esta sobremesa, não se pode deixar de admirar os séculos de conhecimento e habilidades culinárias que nos trouxeram esta iguaria, e agradecer às freiras por esta delícia.
Há muitas mais sobremesas que poderíamos mencionar (como a encharcada, o bolo Fidalgo ou as azevias de Natal), da mesma forma que há muitos mais pratos salgados, sopas e petiscos que não destacamos. Mas esperamos não só ter mostrado exemplos das delícias culinárias do Alentejo, mas também ter dado uma ideia do mundo que criou que deu lugar a esta gastronomia. Um mundo que pode ser duro, e até difícil, mas que está cheio de engenho, adaptabilidade e, o mais importante, sabor.
Os melhores restaurantes de comida regional Alentejana em Lisboa
Casa do Alentejo
Vale a pena visitar não só pela oportunidade de experimentar alguns dos petiscos mais icónicos do Alentejo na atmosfera descontraída da sua taberna ou para se mimar no restaurante mais sofisticado com paredes de azulejos no andar de cima, mas também pelo surpreendentemente impressionante pátio neoárabe, que celebra a ligação histórica do Alentejo ao mundo árabe.
🍴Passe pela taberna e experimente uma variedade de queijos regionais alentejanos e carnes curadas a preços acessíveis.
📍Rua das Portas de Santo Antão 58, 1150-268 Lisboa
Imagem cortesia de Bruno R no TripAdvisor
Zé Varunca
Um restaurante familiar, localizado na encantadora área suburbana de Linha de Cascais em Lisboa, que serve comida regional do Alentejo em porções muito generosas. Recomenda-se um passeio à beira-mar após a refeição.
🍴Não perca os pézinhos de coentrada, o ensopado de borrego ou a sopa de cação – não se consegue ser muito mais tipicamente alentejano do que isto!
📍Av. Eng. Bonneville Franco 22A, 2770-062 Paço de Arcos
Imagem cortesia de Time Out Lisboa
Solar dos Nunes
Tudo neste restaurante (que aparece consistentemente no guia Michelin de Portugal) é tradicional. Desde a decoração, à comida e ao ambiente. Famoso pelos seus pratos de caça, pelas suas açordas bem tradicionais, e pelo pijama de sobremesas, uma tradição de restaurante em desaparecimento de juntar no mesmo prato pequenas porções de várias sobremesas, para que os comensais possam satisfazer a sua gula sem causar demasiado dano ao corpo e à carteira. Visitar esta instituição alentejana em Lisboa é um sucesso garantido.
🍴Independentemente do que encomendar como prato principal, termine em grande estilo com uma pijaminha de sobremesas.
📍Rua dos Lusíadas 68, 1300-366 Lisboa
🌐www.instagram.com/solardosnunes
Imagem cortesia de Lojas Com História
O Galito
O gaspacho é um dos pratos que deve experimentar neste restaurante, servido com carapauzinhos fritos a ser comidos inteira, com cabeça e tudo. O menu é sazonal, pelo que é possível que alguns dos pratos nem sempre estejam disponíveis para os clientes desfrutarem. Mas o que é garantido é o sabor e a tradição, bem como sobremesas tradicionais alentejanas caseiras.
🍴Os melhores pratos a provar no O Galito incluem migas com carne, açorda com bacalhau e o popular gaspacho Alentejano.
📍Rua Adelaide Cabete 7, 1500-441 Lisboa
🌐www.instagram.com/restaurante_o_galito
Imagem cortesia de Time Out Lisboa
Salsa & Coentros
Este encantador restaurante une duas das cozinhas regionais mais robustas e de conforto de Portugal num só lugar: Trás-os-Montes e Alentejo. Aqui, as migas com batata e ovos são famosas por uma razão!
🍴Não perca as migas de batata e ovo!
📍Rua Cel. Marques Leitão 12, 1700-337 Lisboa
🌐http://restaurantesalsaecoentros.pt
Imagem cortesia de Salsa & Coentros no Facebook
Talego
Um restaurante acessível que serve apenas almoços e tem uma opção de menu com ótima relação qualidade-preço (que inclui uma sopa, um prato principal, uma bebida e uma sobremesa) e muitos dos grandes sucessos da tradição culinária alentejana. O menu muda diariamente, mas vale sempre a pena visitar, independentemente dos pratos do dia.
🍴APergunte sobre a sopa do dia, ou experimente a sopa de cação. Se preferir carne, o ensopado de borrego é servido com muita hortelã e tem um sabor incrível.
📍Rua Prof. Sousa da Câmara 147, 1070-103 Lisboa
🌐www.instagram.com/restaurante.talego
Imagem cortesia Time Out Lisboa
O Magano
Outro clássico da cozinha alentejana na capital, o restaurante propriedade dos irmãos Marco e Bruno Luís serve comida de conforto sulista portuguesa pura, em porções grandes e cheias de sabor.
🍴Se gosta de petiscos, peça a salada de orelha, ou encomende algo mais robusto como migas de espargos com entrecosto ou o cabrito assado no forno.
📍Rua Tomás da Anunciação 54A, 1350-328 Lisboa
🌐www.instagram.com/maganorestaurante
Imagem cortesia de Visão
A Curva
Ao bom estilo alentejano, as porções são generosas, o serviço é acolhedor, e a cozinha regional é tratada com o respeito que merece, com foco na parte norte da região, o Alto Alentejo.
🍴Quando estiver na época, peça a sopa de beldroegas. Durante todo o ano pode desfrutar de bochechas de porco preto com migas, ou um reconfortante estufado de favas com entrecosto.
📍Av. Conselheiro Ferreira Lobo 28, 2760-030 Caxias
🌐www.facebook.com/restauranteacurva
Imagem cortesia de Evasões
Taberna do Calhau
Gerida pelo chef Leopoldo Calhau, conhecido por ter deixado uma marca na cena gastronómica de Lisboa, esta taberna contemporânea no coração de Lisboa consegue apresentar uma cozinha moderna, enraizada na tradição, num ambiente encantador e descontraído. Explore os azeites que pode comprar no local e levar para casa.
🍴Seja aventureiro e prove a cabeça de xara.
📍Largo das Olarias 23, 1100-376 Lisboa
🌐www.instagram.com/taberna_do_calhau
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O número de restaurantes que destacamos aqui não é de forma alguma uma lista completa de estabelecimentos do Alentejo em Lisboa. Além disso, muitos restaurantes na capital que não estão especificamente focados nessa região fazem alguns pratos alentejanos extremamente bem. Acreditamos que poderá provar muitas delícias locais do sul de Portugal na sua viagem a Lisboa – afinal de contas, é a maior cidade de Portugal, onde pessoas de todo o país vêm estudar ou trabalhar.
No entanto, esperamos ter despertado a sua curiosidade não só pelas tradições culinárias, mas também pela cultura desta terra a sul de paisagens amplas, pessoas encantadoras e uma história única. Talvez uma viagem ao Alentejo esteja para breve, não acha?
Até lá, convidamo-lo a continuar a inspirar-se em tudo o que diz respeito a viagens e comidas de Portugal, juntando-se à newsletter da Taste of Lisboa e seguindo-nos no Instagram. Tague-nos: @tasteoflisboa #tasteoflisboa.
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