Gabrielle de Saint Venant - Do mundo para A Loja na Mouraria
O que levou uma fotógrafa francesa perder-se de amores pela Mouraria e a abrir uma loja com artesanato tipicamente português? A luz, as pessoas e aquilo a que Gabrielle denomina uma “aldeia internacional”.
Quando veio morar para Lisboa e porquê?
Em 2009 vim fazer uma reportagem fotográfica numa casa na Comporta para uma revista italiana. Na mesma altura visitei um amigo francês que morava na Mouraria, na Calçada de Santo André, e fiquei imediatamente apaixonada por Lisboa e por esta zona da cidade. Gostei logo da luz de Lisboa e os amigos que encontrei moravam aqui, na Mouraria, pelo que foi a primeira zona que conheci. Achei-a muito bonita, muito central e muito característica. Pouco depois comecei a procurar uma casa, que na altura pensava ficar como uma base, pois queria continuar a viajar. Essa era a minha vida, até que descobri que afinal não me apetecia mais viajar, tinha vontade de ficar e o que estava previsto como base transformou-se uma casa para ficar, transformou-se num sítio onde eu queria ficar.
O que acha mais característico na Mouraria, o que torna este bairro diferente dos outros?
No início foi algo mais visual, mesmo antes das obras (agora está ainda mais bonito) quando havia carros estacionados nos passeios e alcatrão eu não reparava nisso, mas sim a beleza dos prédios, da igreja, dos palácios. A paixão começou como fotógrafa, foi algo muito visual, achei a zona muito bonita. E não foi como uma paixão em que depois mudamos de ideias, não! Depois de começar a viver aqui notei que tinha uma vida que gosto imenso: moro numa aldeia, num bairro histórico, é muito diferente da vida em Paris, onde morava antes, mas o que me apaixonou é que é uma aldeia internacional, com os moradores do bairro e uma vida nova, um exotismo das pessoas de outras nacionalidades que vieram morar para cá, quer sejam asiáticos ou ingleses, ou alemães, ou franceses. Há uma mistura de gentes, é mesmo uma aldeia internacional. É o melhor da grande cidade numa atmosfera muito engraçada. E pode parecer uma utopia, mas parece que as pessoas todas vivem em harmonia, os estrangeiros em geral são bem-vindos e isso também foi algo que gostei na Mouraria. Ninguém trata mal os estrangeiros, muito pelo contrário, somos bem acolhidos, todos temos as nossas culturas diferentes, mas o que nos liga é que gostamos de viver aqui e em harmonia.
Como é que uma fotógrafa francesa decide abrir uma loja com produtos portugueses?
Foi algo muito espontâneo, não pensei muito. Pensei que em vez de andar sempre a viajar, à procura de imagens pelo mundo, gostava de parar por aqui e foi algo muito espontâneo. Tive a oportunidade de alugar um espaço e muito espontaneamente comecei a encher com as coisas que ia encontrando em Portugal e que gostava muito. Acho que numa vida anterior devo ter tido um avô português porque até hoje não consigo explicar porque tenho tantas coisas antigas. Acho que há algo nos objetos portugueses, seja no artesanato contemporâneo, nos objetos vintage ou nas antiguidades, há uma poesia portuguesa muito característica, é um lado muito simples, mas com uma carga emotiva muito grande. Há muito amor, as coisas são feitas de uma maneira quase naïve, mas com uma grande carga emocional. Sem ter pensado num conceito, acho que foi a alegria que encontrei em descobrir todas estas coisas quando cheguei e partilhar o que ia encontrando com as pessoas que vêm conhecer a cidade.
O que gosta de comer e qual o restaurante preferido na Mouraria?
O que mais gosto na comida portuguesa, aquilo que é mais interessante está relacionado com as coisas tradicionais. A qualidade/preço das tascas tradicionais é uma coisa espetacular, única em toda a Europa e nesse sentido o top do top é o Trigueirinho. Mas também abri a primeira loja ao lado do Trigueirinho, pelo que até era perigoso lá ficar porque tem um doce da casa alucinante.
E sente falta de algum prato francês?
Depois de quatro anos a viver em Lisboa começo a sentir saudades de algumas coisas da cozinha francesa, como a charcutaria ou os queijos.